FORMAS CONTEMPORÂNEAS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS APLICADAS AO DIREITO DO TRABALHO
Por Marina Silva Torquetti Drosghic, advogada do Ferreira e Chagas
O conflito é inerente às relações sociais e institucionais, não podendo ser visto como algo negativo, na medida em que, em essência, trata-se da divergência de posições e opiniões sobre determinado assunto. Inclusive, o inconformismo advindo do conflito é imprescindível para o avanço social.
O que não se pode confundir é conflito com confronto, sendo esta última uma decorrência da solução da controvérsia não pela defesa de opiniões e visões, mas sim pela utilização de instrumentos que buscam depreciar os argumentos da parte contrária, bem como as caraterísticas do próprio agente, acarretando a violência moral e, mais extrema, na violência física.
Este introito demonstra que o conflito é necessário e decorrente da pluralidade de ideias, sendo que muitas vezes os próprios agentes envolvidos não conseguem encontrar uma forma de pacificação.
Em sua fase mais rudimentar, os conflitos eram resolvidos pela autotutela, método em que prevalecia aquele agente que se impunha pela força, de forma unilateral. Este método é, em regra, refutado em nosso ordenamento jurídico atual sob pena de enquadramento penal. Contudo, raras situações ainda são autorizadas, tais como a legítima defesa, o estado de necessidade e, no âmbito trabalhista, a greve.
Pois bem, outros métodos de solução de conflitos são inerentes à evolução da sociedade, notadamente antes do amplo acesso à jurisdição, como o acordo, juridicamente denominado como transação, método autocompositivo que, em sua origem, era essencialmente extrajudicial, na medida em que as próprias partes envolvidas colocam fim ao conflito mediante concessões recíprocas.
Institutos como conciliação e mediação passaram a ser paulatinamente desenvolvidas e incentivadas em nosso ordenamento jurídico para a solução de conflitos, sejam extrajudiciais ou judiciais, na medida em que um terceiro imparcial contribui, mas sem poder decisório, para a solução do conflito.
Inclusive, no âmbito do processo trabalhista, a tentativa de conciliação é um instituto obrigatório, tratando-se de um princípio jurídico que foi positivado em nosso ordenamento jurídico.
Paulatinamente e paralelamente a estes métodos autocompositivos de solução de conflitos, surge em nosso ordenamento jurídico, na década de 90, o instituto da arbitragem, regulamentado pela Lei nº. 9.307/96, declarada constitucional pelo Supremo Tribunal Federal.
A arbitragem, ao lado do Poder Judiciário, é um método heterocompositivo de soluções de controvérsias em que um terceiro, imparcial, irá decidir a questão, razão pela qual se fala hoje a jurisdição não é mais uma exclusividade do Poder Judiciário.
Inclusive, a partir da percepção de que o Poder Judiciário, por muitas vezes, não foi capaz de prestar uma atividade jurisdicional eficiente e célere, é que se passou a defender com mais ênfase o instituto da arbitragem.
Porém, nos últimos 10 anos, o ordenamento jurídico apresentou interessante e profundas alterações legislativas no tocante aos métodos contemporâneos de solução de conflitos. No ano de 2015, foram editadas as Leis nº. 13.105 e 13.140 que tratam, respectivamente, do Código de Processo Civil e da Mediação entre particulares e autocomposição nos conflitos no âmbito da administração pública.
Além disso, foi editada a Lei 13.129 que promoveu alterações na Lei nº. 9.307/96 para autorizar a arbitragem no âmbito da administração pública, além da Lei nº. 13.467/17, que trouxe profundas alterações na CLT ao passar a autorizar expressamente o instituto da arbitragem nas relações individuais de trabalho, bem como a rescisão contratual por acordo entre as partes e a homologação de acordo extrajudicial.
No âmbito trabalhista, busca da solução pré-processual dos conflitos já se fez presente desde 2000 por meio da Comissão de Conciliação Prévia (CCP) instituída pela Lei nº. 9.958/00. Porém, considerando a submissão prévia impositiva de qualquer demanda de natureza trabalhista à CCP, o Supremo Tribunal Federal decidiu que, não obstante a legitimidade do instituto, a sua obrigatoriedade contraria o direito constitucional de acesso ao Poder Judiciário.
Assim, a CCP torna-se mais uma opção para a tentativa de se solucionar os conflitos trabalhistas, mas sem o caráter impositivo na medida em que vai de encontro ao princípio da consensualidade, uma das diretrizes basilares do microssistema de solução alternativa de conflitos.
Da mesma forma, o instituto da arbitragem já possuía aplicação no Direito do Trabalho antes da reforma trabalhista, mas limitada aos dissídios coletivos, nos termos do §1º, do artigo 114, da CF/88.
Certamente, a aplicação da arbitragem nos dissídios individuais trabalhistas ainda é o método contemporâneo de soluções de conflitos que apresenta divergência doutrinária e jurisprudencial, diante da principiologia do Direito Individual do Trabalho.
Isso porque vigoram os princípios da indisponibilidade e da irrenunciabilidade dos direitos trabalhistas, ao passo que a Lei nº. 9.307/96 traz expressamente em seu texto que somente direitos patrimoniais disponíveis podem ser objeto de arbitragem.
Ademais, da leitura do artigo 507-A, da CLT, extrai-se que a escolha pela arbitragem como método de solução de conflitos nos contratos individuais do trabalho se faz por meio da cláusula compromissória arbitral, espécie de convenção de arbitragem que antecede a existência do conflito e reforça o caráter indisponível dos direitos trabalhistas na medida em que pactuado na vigência do contrato de trabalho.
Lado outro, os defensores da cláusula arbitral afirmam que a nova legislação trabalhista ajustou os preceitos celetistas ao avanço social e à autonomia privada, recolocando o ser humano no centro do ordenamento jurídico e detentor da sua liberdade individual, na medida em que o mesmo artigo celetista estabelece que a cláusula arbitral somente se manterá hígida se tiver sido inserida por iniciativa do empregado ou mediante sua concordância expressa.
Fato é que no tocante à arbitragem nos dissídios individuais trabalhistas a questão somente se pacificará quando a questão chegar ao Supremo Tribunal Federal.
O que se pode concluir, portanto, é que as formas contemporâneas de solução de conflitos decorrem do reconhecimento da falibilidade do Poder Judiciário e da necessidade de se ter um leque de opções para que os conflitantes possam optar por aquele que melhor irá solucionar o conflito, inclusive incentivando que os conflitantes atuem como agentes solucionadores dos conflitos.